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Complementação dos serviços de saúde no âmbito do SUS

Atualizado: 30 de dez. de 2021

A saúde é um direito social garantido na nossa Constituição da República, especificamente no art. 6º e seu cuidado constitui competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme preceitua o art. 23, inciso II, sendo, pois, direito de todos e dever do Estado garantir a população o direito ao acesso aos serviços de saúde pública, por meio de políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, em cumprimento ao disposto no art. 196 da carta magna.


As ações e serviços de saúde são matérias de relevância pública, que constituem um Sistema Único de Saúde, e devem ser exercidas diretamente ou através de terceiros, conforme consigna o art. 197 e 198 da CF/88, devendo ser organizado observando, dentre outros, o atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais.


A Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, ao abordar a participação complementar, estabelece:


"Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.


Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.


Art. 25. Na hipótese do artigo anterior, as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos terão preferência para participar do Sistema Único de Saúde (SUS).


Art. 26. Os critérios e valores para a remuneração de serviços e os parâmetros de cobertura assistencial serão estabelecidos pela direção nacional do Sistema Único de Saúde (SUS), aprovados no Conselho Nacional de Saúde.


§ 1° Na fixação dos critérios, valores, formas de reajuste e de pagamento da remuneração aludida neste artigo, a direção nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) deverá fundamentar seu ato em demonstrativo econômico-financeiro que garanta a efetiva qualidade de execução dos serviços contratados.


§ 2° Os serviços contratados submeter-se-ão às normas técnicas e administrativas e aos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), mantido o equilíbrio econômico e financeiro do contrato.


(...)


§ 4° Aos proprietários, administradores e dirigentes de entidades ou serviços contratados é vedado exercer cargo de chefia ou função de confiança no Sistema Único de Saúde (SUS)."


Em atenção ao disposto no art. 16, inciso XIV[1], da Lei supracitada, o Ministério da Saúde emitiu a PORTARIA MS/GM 1.034, de 5 de maio de 2010 dispondo sobre a participação complementar das instituições privadas com ou sem fins lucrativos de assistência à saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, e posteriormente a PORTARIA MS/GM 2.567, de 25 de novembro de 2016, esta última revogando os termos da primeira.


Da normativa em vigor, extrai-se os seguintes regramentos:


Art. 3º Nas hipóteses em que a oferta de ações e serviços de saúde públicos próprios forem insuficientes e comprovada a impossibilidade de ampliação para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinado território, o gestor competente poderá recorrer aos serviços de saúde ofertados pela iniciativa privada.


§ 1º Na complementação dos serviços de saúde deverão ser observados os princípios e as diretrizes do SUS e as normas técnicas e administrativas aplicáveis.


§ 2º Assegurada a preferência às entidades filantrópicas e sem fins lucrativos e ainda persistindo a necessidade quantitativa dos serviços demandados, o ente público recorrerá às entidades com fins lucrativos.

§ 3º A participação complementar das instituições privadas de assistência à saúde no SUS será formalizada mediante a celebração de contrato ou convênio com o ente público, observando-se os termos da Lei nº 8.666, de 1993, e da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, de acordo com os seguintes critérios:


I - convênio: firmado entre ente público e a instituição privada sem fins lucrativos, quando houver interesse comum em firmar parceria em prol da prestação de serviços assistenciais à saúde; e


II - contrato administrativo: firmado entre ente público e instituições privadas com ou sem fins lucrativos, quando o objeto do contrato for a compra de serviços de saúde.


§ 4º As entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos deixarão de ter preferência na contratação com o SUS, e concorrerão em igualdade de condições com as entidades privadas lucrativas, no respectivo processo de licitação, caso não cumpram os requisitos fixados na legislação vigente.


§ 5º As entidades filantrópicas e sem fins lucrativos deverão satisfazer, para a celebração de instrumento com a esfera de governo interessada, os requisitos básicos contidos na Lei nº 8.666, de 1993, e no art. 3º da Lei nº 12.101, independentemente das condições técnicas, operacionais e outros requisitos ou exigências fixadas pelos gestores do SUS.


§ 6º Para efeito de remuneração, os serviços contratados deverão utilizar como referência a Tabela de Procedimentos do SUS.


Nessa perspectiva, as instituições privadas podem participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos, conforme disposto no art. 199, § 1º da Constituição Federal c/c Art. 4º § 2º da Lei 8.080/90.


Para isso, tratando-se de ações voltadas à atividade finalística do Estado, essa participação complementar de Pessoas Físicas ou Jurídicas (empresas privadas) somente é permitida caso esgotadas todas as providências necessárias no âmbito da Administração Pública.


Isso porque os serviços de saúde devem ser ofertados diretamente pelo Estado, podendo a Administração firmar acordos com órgãos da administração pública direta e/ou indireta para execução desses serviços.


De forma geral é possível a realização de convênios e termos de execução descentralizada (Termo de Cooperação), observadas as disposições do Decreto Federal 6.170, de 25 de julho de 2007, da Portaria Interministerial 424, de 30 de dezembro de 2016[2], e, Decreto Estadual 3.024/2011, dependendo da origem dos recursos a serem transferidos (federal ou estadual).


No âmbito do SUS, o Ministério da Saúde adota instrumentos específicos que possuem a mesma natureza dos indicados acima, com regramentos particulares a cada caso, a exemplo do Protocolo de Cooperação, com fulcro no art. 3º da Portaria 699/GM, de 30 de março de 2006 c/c art. 1º da PORTARIA GM/MS 161, de 21 de janeiro de 2010, e do Contrato Organizativo da Ação Pública da Saúde – COAP, previsto no Decreto 7.508, de 28 de junho de 2011 e na Resolução 02, de 29 de setembro de 2011[3].


Não sendo possível a prestação de serviços pela Administração Pública, pode ser realizado, com a devida justificativa, convênios com entidades privadas sem fins lucrativos, quando houver interesse comum em firmar parceria em prol da prestação de serviços assistenciais à saúde.


Neste caso, podem ser realizadas as seguintes parcerias, conforme os respectivos regulamentos próprios:


I – Convênios com Entidades Filantrópicas e Privadas sem fins lucrativos: § 1º do art. 199 da Constituição Federal;

II – Contrato de Gestão com Entidades Privadas sem fins lucrativos habilitadas como Organizações Sociais - OS: Lei 9.637, de 15 de maio de 1998[4];

III – Termo de Parceria com Entidades Privadas sem fins lucrativos habilitadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP: Lei 9.790, de 23 de março de 1999[5].


Não obtendo êxito, persistindo a necessidade de complementação de serviços, é, ainda, permitido ao Estado se valer dos serviços da iniciativa privada (Pessoa Física ou Jurídica de Privado com Fins Lucrativos), por meio de contratação, observado o devido processo licitatório ou de contratação direta, em observância às disposições da Lei 8.666/93.


Para isso, devem ser devidamente justificados nos autos os motivos que impossibilitam a execução das atividades de forma direta, demonstrando os gargalos enfrentados pelo Estado para prestação desses serviços, bem como a comprovação por meio de análises técnicas, estatísticas e econômicas que demonstrem ser a prestação de serviços essenciais de saúde ofertadas pelas entidades privadas mais eficaz, no atual contexto.


As normas para licitações e contratos da Administração Pública foram instituídas pela Lei 8.666/93 que regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal.


O art. 2º da Lei de Licitações dispõe que as obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses de licitação dispensada[6], dispensável[7] ou inexigível[8], mediante contratação direta, observados os requisitos legalmente exigidos em lei, dentre os quais se destacam a razão da escolha do fornecedor ou executante e a justificativa dos preços por serem elementos fundamentais no processo de dispensa ou inexigibilidade de licitação, conforme os termos do art. 26, parágrafo único da Lei 8.666/93.


Importante salientar, que o gestor público deve agir com cautela ao se decidir pela contratação direta, haja vista a própria Lei de Licitações considerar ilícito penal dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses consideradas legais.


Dentre as hipóteses legais de contratação pela via direta, existe a figura do credenciamento como espécie de inexigibilidade de licitação, com fulcro no art. 25, caput, da Lei 8.666/93, que estabelece ser inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição.


Nesse caso, dependendo do interesse público é possível contratar o maior número de interessados possíveis em realizar determinado serviços, inexistindo, pois, competitividade entre os participantes do credenciamento, que poderão executar os serviços conforme as condições e cronograma desenvolvido pela Administração.


Cumpre salientar que os serviços de saúde ofertados no âmbito da Administração Pública são realizados por servidores investidos em cargo público, integrando-se, pois, os quadros de cargos e carreira disponibilizados pela Administração.


Nesse sentido, por se tratar de serviços voltados a atividade fim do Estado e disponibilizados pelo SUS, tais serviços devem ser prestados de forma efetiva e direta pelo Estado por meio de seleção profissional mediante concurso público, razão pela qual possível contratação de Pessoa Física ou Jurídica (empresa privada) para esta finalidade deve ser provisória e excepcional, isto é, até que o Estado adote as providências necessárias para convocação de profissionais classificados em concursos público válido, ou, realize nova seleção, caso inexista disponibilidade de vaga.


Isso porque, o art. 37, inciso II, da Constituição Federal preceitua que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.


Mesmo com a Edição da Lei 13.429, DE 31 DE MARÇO DE 2017, conhecida como a “Lei da Terceirização”, entendo particularmente, que não se teve como objetivo a liberação da terceirização de empresas prestadoras de serviços para execução de atividades-fim, o que se tem de forma expressa é o permissivo nesses termos ao contrato de trabalho temporário, conforme disposição do art. 9º, § 3º:


§ 3º O contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços.


Pondera-se que se trata de legislação que aborda tema de cunho trabalhista, cuja natureza desse ramo pela Doutrina é divergente, se privado, público ou misto. De fato, não é norma que atinge apenas as Pessoas Jurídicas de Direito Privado, mas também as Pessoas Jurídicas de Direito Público, naquilo que não afeta os princípios e regras que norteiam a atividade pública, já que o Poder Público está obrigado a observar as normas trabalhistas, em virtude da solidariedade nas relações trabalhistas existentes entre as empresas terceirizadas e seus respectivos funcionários. Isto é, não necessariamente se trata de norma essencialmente pública, mas privada que se relaciona com outros ramos do direito.


Acerca do assunto, destaca-se entendimento de Maurício Godinho Delgado[9]:


A concepção unitária, mais correta, do ponto de vista científico, integra-se, naturalmente, ao debate sobre a classificação do ramo juslaboral no Direito Público, Privado ou Social. Ou seja, o Direito do Trabalho é um ramo jurídico unitário que se enquadra no campo do Direito Privado (posição hegemônica) — embora haja autores que prefiram realizar esse enquadramento no Direito Público ou, ainda, no Direito Social.


Em que pese, ser aplicada a norma privada em caráter subsidiário aos Entes Públicos, são regidos, em regra, por normas e princípios diferentes daqueles aplicados ao setor privado, em razão do zelo com a coisa pública, respeitados os ditames constitucionais.


Dessa feita, é sabido que o Estado tem o dever de fiscalizar a observância por seus contratados das obrigações (direitos e deveres) trabalhistas. Contudo seu alicerce está resguardo nas normas de caráter meramente público e na própria constituição federal.


Importante trazer a luz entendimento externado pelo Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da IV Região[10]:


“O art. 9º do mesmo diploma esclarece que o trabalho temporário é realizado também em atividades-fim da empresa. O outro trabalho arregimentado objeto da lei – a terceirização – não guarda no texto normatizado a mesma expressão, sinalizando que não é cabível a aceitação de sua utilização. A previsão expressa de que o trabalho temporário pode atuar em atividades-fim da prestadora, e o silêncio a respeito do trabalho terceirizado, assinala que não há incidência dessa excepcionalidade. Não é cabível trabalho terceirizado em atividades-fim, conforme compreensão ainda válida da Súmula n. 331 do TST.


Feita as devidas ponderações, caso o Estado não tenha condições de exercê-los de forma direta (ou indireta, através de órgãos vinculados à Administração Pública) e imediata, seja mediante a convocação de aprovados em concurso público ou mediante acordos com órgãos da administração pública direta e/ou indireta para execução dos serviços de saúde, pode se valer dos serviços da iniciativa privada, em caráter complementar, observada a preferência dada às entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos, estabelecida por lei:


I - Convênios com Entidades filantrópicas e privadas sem fins lucrativos;

II - Contrato de Gestão com Entidades Privadas sem fins lucrativos habilitadas como Organizações Sociais – OS;

III - Termo de Parceria com Entidades Privadas sem fins lucrativos habilitadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP;

IV – Contratação de Pessoas Físicas ou Jurídicas com fins lucrativos.


É necessário que se justifique a contratação complementar dos serviços públicos de saúde, que sejam apresentados os motivos que impossibilitam a execução das atividades de forma direta, demonstrando os gargalos enfrentados pelo Estado para prestação desses serviços, abordando os seguintes pontos:


I – A insuficiência das disponibilidades de serviços para garantia da cobertura assistencial à população;

II - A inviabilidade de redimensionamento dos recursos humanos existentes, readequações das escalas médicas, demonstrando a insuficiência de pessoal, apresentando os dados e informações necessárias;

III – A inviabilidade de convocação de aprovados em concurso público ou de realização de novo certame em curto prazo, e, previsão temporal necessária para atendimento da demanda em médio ou longo prazo;

IV – A inviabilidade de pactuações com outros órgãos da Administração Direta ou entidades da Administração Indireta;

V – A inviabilidade de pactuar com entidades filantrópicas e privadas sem fins lucrativos existentes no Estado do Acre; de se firmar Contrato de Gestão com Entidades Privadas sem fins lucrativos habilitadas como Organizações Sociais – OS, porventura existentes; de se firmar Termo de Parceria com Entidades Privadas sem fins lucrativos habilitadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, a fim de justificar a contratação de Pessoas Físicas ou Jurídicas com fins lucrativos.


Rio Branco, 27 de julho de 2017.


Por: Rodrigo Galgani, Gestor de Políticas Públicas.

Bacharel em Direito, Especialista em Direito Sanitário.


[1] Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete: (...) XIV - elaborar normas para regular as relações entre o Sistema Único de Saúde (SUS) e os serviços privados contratados de assistência à saúde; [2] Revoga Portaria Interministerial 507/2011. [3] Assunto tratado pela Diretoria Jurídica por meio do PARECER SESACRE/DIRJUR/DJLC 652/2015 e do ADITAMENTO AO PARECER SESACRE/DIRJUR/DJLC 652/2015; [4] Tema abordado pela Diretoria Jurídica por meio do PARECER SESACRE/DIRJUR/DJLC 666/2015, contendo minuta do respectivo Contrato de Gestão (http://sesacrelegis.wixsite.com/diretoriajuridica/contrato-de-gestao) . [5] Tema abordado pela Diretoria Jurídica por meio do PARECER SESACRE/DIRJUR/DJLC 273/2015. [6] Art. 17 da Lei de Licitações. [7] Art. 24 da Lei de Licitações. [8] Art. 25 da Lei de Licitações. [9] Curso de direito do trabalho / Mauricio Godinho Delgado. — 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017. [10] http://www.amatra4.org.br/publicacoes/artigos/1235-lei-13-429-de-2017-e-a-intermediacao-de-trabalho-no-brasil-perspectivas-politicas-e-hermeneuticas


Nota: PARECER TÉCNICO SESACRE/SAAS/ASSTEC 08/2017

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